OUTROS CANTOS: MARGENS CONTAMINADORAS ENTRE O AUTOBIOGRÁFICO E O FICCIONAL

Autores

  • Janaína Buchweitz e Silva Universidade Federal de Pelotas

Palavras-chave:

Escritas de si. Autoficção. Literatura brasileira contemporânea.

Resumo

A literatura brasileira contemporânea segue a tendência da literatura ocidental, ao inserir-se num quadro que utiliza com bastante frequência da primeira pessoa narrativa, apresentando muitas vezes uma interface entre o real e o ficcional que complexifica as relações entre ficção e não ficção: para Santiago (2008), o processo de contaminação entre o autobiográfico e o ficcional gera um novo discurso, de caráter híbrido, ao qual convém chamarmos de autoficção, formado por margens contaminadoras, ao invés das fronteiras limitadoras do autobiográfico e do ficcional. Já Klinger (2012) entende que há um questionamento da identidade nas práticas contemporâneas da literatura do eu, em que o autor retorna na forma de um jogo que brinca com o sujeito real. Para Viegas (2007), na literatura contemporânea o sujeito fragmentado e descentralizado influencia as questões de autoria. Em Outros cantos (2016), Maria Valéria Rezende reúne uma série de experiências que perpassam diversificadas situações, que vão desde supostas experiências da autora/narradora/personagem, insinuadas pela narrativa em primeira pessoa e pelo uso romanceado de seu nome próprio, até os relatos de experiências de diversos personagens secundários, que surgem ao longo da narrativa. Tendo como pano de fundo rememorações sobre o período ditatorial brasileiro, a autora produz um discurso literário permeado de história e memória que problematiza a ideia de referência, abandonando os rígidos binarismos entre fato e ficção. Assim, esta comunicação visa refletir sobre o caráter híbrido da narrativa da autora, apontando características da escrita autoficcional.

Referências

ARFUCH, Leonor. El espacio biográfico: dilemas de la subjetividad contemporanea. 1ªed. 3ª reimp. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2010.
BERND, Zilá. Imaginários americanos: transferências, interpenetrações, transações. In: A persistência da memória. Porto Alegre: BesouroBox, 2018.
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006.
GAGNEBIN, Jeanne-Marie. “Entre moi et moi-même” (“Entre eu e eu-mesmo”). In: GALLE, Helmut, org. e outros. Em primeira pessoa: abordagens de uma teoria da autobiografia. São Paulo: Annablume, 2009.
KLINGER, Diana. Escritas de si, escritas do outro: o retorno do autor e a virada etnográfica. 2ª ed. Rio de Janeiro: 7Letras, 2012.
REZENDE, Maria Valéria. Outros cantos. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2016.
SANTIAGO, Silviano. Meditação sobre o ofício de criar. Aletria, Belo Horizonte, v.18, n.01, p.173-179, 01 jul. 2008. Disponível em: http://revistazcultural.pacc.ufrj.br/meditacao-sobre-o-oficio-de-criar-de-silviano-santiago-2/
SARLO, Beatriz. Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
STRAUB, Jürgen. “Memória autobiográfica e identidade pessoal. Considerações histórico-culturais, comparativas e sistemáticas sob a ótica da psicologia narrativa”. In: GALLE, Helmut, org. e outros. Em primeira pessoa: abordagens de uma teoria da autobiografia. Trad. Marcelo T. A. Silva. São Paulo: Annablume, 2009.
VIEGAS, Ana Cláudia Coutinho. O “retorno do autor” – relatos de e sobre escritores contemporâneos. In: VALLADARES, Henriqueta do Couto Prado. Paisagens ficcionais: perspectivas entre o eu e o outro. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007.

Downloads

Publicado

2022-06-26