Programação Semana dos Povos Indígenas 2023
Povos Originários: alteridade, violências e protagonismo
Palavras-chave:
SPI; Povos originários; alteridade; violências, protagonismo.Resumo
Essa edição da Semana dos Povos Indígenas tem como tema Povos Originários: alteridade, violências e protagonismo. São três questões recorrentes e desafiadoras na luta dos povos indígenas no Brasil e que a sociedade, governamental e civil, precisa debater e assumir compromisso com as lutas de reivindicações dos povos originários.
Vivemos um novo momento histórico com relação aos povos indígenas no Brasil. Estamos deixando a "era do Indigenismo" para ingressar na "era do protagonismo indígena", após atravessarmos várias fases do Indigenismo – e até de sua negação, com o bolsonarismo.
Agora, com o Ministério dos Povos Indígenas, comandado pela ex-presidente da APIB (Associação dos Povos Indígenas do Brasil) e deputada federal eleita Sônia Guajajara (PSOL/SP), e a FUNAI, comandada pela ex-deputada federal Joênia Wapixana (REDE/RR) e muitos outros cargos importantes no Governo Federal sendo também ocupados por reconhecidas lideranças indígenas, como a SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena, do Ministério da Saúde), pelo ex-vereador Weibe Tapeba (PT/CE), o protagonismo das políticas públicas direcionadas aos povos indígenas passa a ser comandado por representantes destes povos.
Seguindo esta tendência, algumas unidades federativas estão propondo também a criação de Secretarias Estaduais de Povos Indígenas, que seriam chefiadas por lideranças indígenas regionais. É o caso concreto do Tocantins, onde Narubia Werreria, liderança do povo Apinajé, foi recém-empossada secretária Estadual dos Povos Originários e Tradicionais. No Ceará, Juliana Alves, conhecida como Cacika Irê, liderança do povo jenipapo-kanindé, assumiu a Secretaria dos Povos Indígenas naquela UF. Estas iniciativas diferem-se das anteriores, como a que, em 2009, criou no Amazonas a Secretaria de Estado para os Povos Indígenas (SEIND).
Durante a Conferência dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil (18 a 21 de abril de 2000), ocorrida na aldeia de Coroa Vermelha (Santa Cruz de Cabrália/BA), que reuniu mais de três mil representantes de 140 povos indígenas de todo o país, Davi Kopenawa Yanomami afirmara que a luta precisaria deixar o protagonismo indigenista das ONGs e passar a ser conduzida diretamente pelos próprios povos indígenas. Recusando-se a participar de forma folclórica nas comemorações oficiais dos 500 anos de descobrimento do Brasil pelos portugueses, organizaram uma passeata até Porto Seguro (BA), onde se encontra o presidente da República e outras autoridades em festividades. A manifestação pacífica foi violentamente reprimida por um batalhão do pelotão de choque e da cavalaria da Polícia Militar da Bahia, que utilizou bombas de gás lacrimogênio, bombas de efeito moral e balas de borracha contra mulheres e crianças. O documento final da Conferência dizia que “Apesar do peso da velha história (...) lançamos o nosso grito de guerra e fundamos o início de uma nova história, a grande história dos ‘Outros 500’". Passaram-se 23 anos e o futuro chegou.
Neste período muitas lideranças estudaram ou colocaram seus filhos para estudar nas universidades, visando assumir o protagonismo não apenas das lutas, mas também como um preparo necessário para ocupar o aparato burocrático do Estado. Foi uma trajetória longa, que passou pela construção da APIB, a organização dos acampamentos ‘Terra Livre’ (ATL), em Brasília, a criação da SESAI, dos etnoterritórios culturais, dos jogos indígenas etc. até os tempos atuais onde as ideias plantadas em Coroa Vermelha floresceram. Foi uma trajetória que partiu do indigenismo ao protagonismo indígena, por mais de 20 anos.
Nestes 523 anos, a afirmação das identidades dos diversos povos indígenas sempre esteve presente, caminhando ao lado de todas as formas de violência contra homens, mulheres e crianças – das violências ‘simbólicas’ e culturais às violências físicas, como o estupro, a fome e o genocídio. Vimos estarrecidos a recente tragédia Yanomami, provocada pelo garimpo ilegal na Amazônia: são mais de 400 hectares invadidos. Porém, mais próximos de nós, os povos Munduruku e Kayapó somam mais de 9 mil hectares ocupados ilegalmente, com um enorme desastre ambiental no rio Tapajós.
A Semana dos Povos Indígenas em 2023 dará destaques ao Protagonismo Indígena, onde destaca-se o protagonismo feminino, às violências, do passado e atuais, e à Alteridade – capacidade de se colocar no lugar do outro, que todos nós devemos aprender a exercer. As expressões culturais indígenas se apropriam de formas, meios e ferramentas de comunicação não indígenas, criando novas expressões culturais brasileiras, ao mesmo tempo em que a cantora Anitta utiliza roupa confeccionada por artesãs Guajajara, da Aldeia Lagoa Quieta (MA), no carnaval de Olinda e Recife.
A programação constou de palestras, oficinas comunicações orais, exibição de filmes e debates, ações educativas com estudantes do ensino fundamental e médio.